segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Ele Não Vem

Ele Não Vem

 

Debruçada sobre a penteadeira, Marcela maquilava-se graciosamente, contorcendo os lábios. A porta estava fechada, mas ele fora tão cuidadoso que ela nem percebera a sua presença. “Você está linda”, disse ele com um sorriso torto, olhos melancólicos e semi-cerrados. “Obrigada, Maninho! Vou sair com o Ricardo, ele vem me buscar em alguns minutos". Ele caminhou até a sacada e pôs-se a observar o céu. “Marcela, olha que fim de tarde linda. Tons cinzas e negros, nem uma estrela sequer. Escuridão”. Ela não deu muita atenção. “Pois é…Vai ficar em casa hoje?”, perguntou enquanto ajeitava os cabelos. “Sim, estou fazendo aquela torta que você adora, igual a mãe fazia. Ficará pronta em dez minutos. Quer um drink enquanto isso?”. Ela continuava concentrada no seu ritual de beleza, olhou para ele rapidamente. “Eu adoraria, mas o Ricardo pode chegar a qualquer momento. Vamos deixar para um outro dia, sim?”. Ele não respondeu. Deu as costas para ela e retornou à sacada. Aquilo era demais, não suportava a idéia de dividi-la com outro homem. Solução drástica, mas ele não se arrependia. O que estava feito, estava feito. “Ele não vem”, disse ainda observando o negrume do céu. Marcela parou de aprumar-se. “O que disse?”. Ele calmamente virou-se e, olhando fixamente para sua meia-irmã, repetiu. “Ele não virá, Marcela. Nem hoje, nem amanhã…Nem nunca mais”. Estava sério, não havia sorriso torto, apenas melancolia. “Do que você está falando, Marcelo? Estou ficando assustada”. Ele caminhou em sua direção. “Estou apaixonado por você. Eu te amo, fuja comigo”. “Você está louco, vou esperar o Ricardo lá embaixo”. Virou-se para sair, mas ele a deteve, puxando-a pelo braço. “Você não vai a lugar algum! Já disse, ele não virá. E sabe por que? Ele está morto, eu o matei! E você fará o que eu mandar, a menos que queira ir presa”. “Seu assassino, eu vou…”. Mas ele tapou-lhe a boca. “Não, não vai. Tomei muito cuidado, todas as provas apontam para você”. Marcela chorava desesperadamente, as lágrimas caiam sem dificuldade. “Ah, meu bem…Sorria! Vamos comemorar, a torta já deve estar pronta”.

Por Tamires Lemos de Assis

 

Ps: conto elaborado como redação do cursinho com base em um conto de Machado de Assis, onde dois irmãos de mesmo nome, sendo ela filha legítima e ele adotado, podem ser íntimos além do laço de criação que os une.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

ESTAMOS COM FOME DE AMOR - Arnaldo Jabor

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[Nesta segunda-feira(20) na aula de redação do cursinho, lemos um texto muito interessante do Arnaldo Jabor, que prendeu a minha atenção. O curioso, é que ele não se encaixa apenas na minha vida, mas na de todos. Tenho certeza: qualquer um que ler estas palavras, minuciosamente escolhidas, irá se identificar com pelo menos alguns pontos do artigo.]

"Uma vez Renato Russo disse com uma sabedoria ímpar: "Digam o que disserem,o mal do século é a solidão". Pretensiosamente digo que assino embaixo sem dúvida alguma. Parem pra notar, os sinais estão batendo em nossa cara todos os dias. Baladas recheadas de garotas lindas, com roupas cada vez mais micros e transparentes, danças e poses em closes ginecológicos, chegam sozinhas e saem sozinhas. Empresários, advogados, engenheiros que estudaram, trabalharam,alcançaram sucesso profissional e, sozinhos.

Tem mulher contratando homem para dançar com elas em bailes, os novíssimos "personal dance", incrível. E não é só sexo não, se fosse, era resolvido fácil, alguém duvida? Estamos é com carência de passear de mãos dadas, dar e receber carinho sem necessariamente ter que depois mostrar performances dignas de um atleta olímpico, fazer um jantar pra quem você gosta e depois saber que vão "apenas" dormir abraçados, sabe essas coisas simples que perdemos nessa marcha de uma evolução cega. Pode fazer tudo, desde que não interrompa a carreira, produção. Tornamos-nos máquinas e agora estamos desesperados por não saber como voltar a "sentir", só isso, algo tão simples que a cada dia fica tão distante de nós. Quem duvida do que estou dizendo, dá uma olhada no site de relacionamentos ORKUT, o número que comunidades como: "Quero um amor pra vida toda!", "Eu sou pra casar!" até a desesperançada "Nasci pra ser sozinho"! Unindo milhares, ou melhor, milhões de solitários em meio a uma multidão de rostos cada vez mais estranhos, plásticos, quase etéreos e inacessíveis. Vivemos cada vez mais tempo, retardamos o envelhecimento e estamos a cada dia mais belos e mais sozinhos. Sei que estou parecendo o solteirão infeliz, mas pelo contrário, pra chegar a escrever essas bobagens (mais que verdadeiras) é preciso encarar os fantasmas de frente e aceitar essa verdade de cara limpa.

Todo mundo quer ter alguém ao seu lado, mas hoje em dia é feio, démodé, brega. Alô gente! Felicidade, amor, todas essas emoções nos fazem parecer ridículos, abobalhados, e daí? Seja ridículo, não seja frustrado, "pague mico", saia gritando e falando bobagens, você vai descobrir mais cedo ou mais tarde que o tempo pra ser feliz é curto e cada instante que vai embora não volta mais (estou muito brega!), aquela pessoa que passou hoje por você na rua, talvez nunca mais volte a vê-la, quem sabe ali estivesse a oportunidade de um sorriso à dois. Quem disse que ser adulto é ser ranzinza.

Um ditado tibetano diz que se um problema é grande demais, não pense nele e se ele é pequeno demais, pra que pensar nele. Dá pra ser um homem de negócios e tomar iogurte com o dedo ou uma advogada  de sucesso que adora rir de si mesma por ser estabanada; o que realmente não dá é pra continuarmos achando que viver é out, que o vento não pode desmanchar o nosso cabelo ou que eu não posso me aventurar a dizer pra alguém: "vamos ter bons e maus momentos e uma hora ou outra, um dos dois ou quem sabe os dois, vão querer pular fora, mas se eu não pedir que fique comigo tenho certeza de que vou me arrepender pelo resto da vida. Antes idiota que infeliz!"