Sempre olhei para a velhice com os olhos de uma criança: é a época da vida na qual os avós estão “de férias”. A avó gosta de assar biscoitos de polvilho e fazer sorvete de beterraba, cozinhar uma macarronada com muito molho e comprar queijo de minas para comer com goiabada. O avô sempre promovendo partidas de dominó, bingo e damas, valendo como prêmio deliciosos chocolates, pirulitos, balas, chicletes e outras guloseimas. Em toda parte tinha algum gibi da Turma da Mônica. A casa está sempre limpa, as roupas de cama engomadas, a mesa posta com comidas suculentas e as flores sempre regadas, exalando um perfume adocicado pelo quintal.
Ser velhinho é andar de vagar, meio curvado. É usar dentadura, tirá-la para dormir e esquecê-la dentro de um copo d’água no criado-mudo. É ter aquela pelanquinha fina debaixo dos braços, tão gostosa de apertar. É usar pijama e pantufas o dia inteiro. É guardar fotografias cor sépia, disco de vinil e moedas antigas. Ter como parte da decoração lembrancinhas de todas as suas bodas.
Avós sempre contam boas histórias. O avô, quando jovem, ia para a pescaria e voltava com peixes enormes, mas tão grandes que para carregá-los era necessário vários homens. Ele era demais, as feras do mar nunca o venciam. A avó conquistava todos por onde passava. Contava que os homens da cidade eram apaixonados por ela, e que o número de pedidos de casamento que recusara podia ser apenas comparado com a quantidade de lágrimas que derrubou durante toda a sua vida.
Férias de Julho é mais gostoso na casa dos avós: encontrar os primos que não via há tempos, brincar no parquinho da praça, ir na matinê com fantasia de Rambo, assistir aos Jogos de Inverno, pular Carnaval na rua seguindo os blocos, ganhar boné do Timão e assistir ao jogo comendo pipoca, doce de leite com queijo de palito até cansar. Preparar apresentações musicais nos eventos familiares, cantar “As Quatro Estações” de Sandy e Júnior, montar um grupo cover das Spice Girls e ser a Victoria, com direito a dancinha e autógrafos.
Descrevi a MINHA ideia, quando criança, da velhice em Ouro Fino-MG, onde moram meus avós: Lourdes e Geraldo. Criança na sua inocência, sempre acha que os seus avós são imortais. Quem nunca fez com que eles prometessem que não iriam morrer? Que assim como os nossos pais, nunca deveriam nos deixar? Todo mundo tem medo de perder aqueles que mais ama.
Mineira de sangue e não de estadia, percebo que os poucos dias em que fiquei na minha terrinha foram suficientes para criar raízes, estas que permanecem bem fixas até hoje. Percebo agora, o quanto tudo isso faz parte de mim, o quanto sinto por não ser mais criança, por ter agora que encarar a vida como ela realmente é: imprevisível.
Tenho constantemente vontade de pegar meus avós, colocá-los em um potinho e guardá-los comigo para sempre, sempre e sempre. Na verdade, eu faria uma coleção de potinhos, colocaria neles todas as pessoas que amo, por que só a ideia de não tê-los comigo me dói. Queria ter feito isso com a minha vó Amélia, com o meu primo Wandrey, com tanta gente especial que passou pela minha vida, deixou marcas e foi embora quando eu menos esperava. Mas eu seria muito egoísta se fizesse isso. Devemos deixar livre as pessoas que amamos, por que se tudo for verdadeiro, não importa o que aconteça elas estarão sempre conosco.
Nesse feriado de 7 de Setembro irei para minas, cessar a saudade imensa, de quase dois meses, que estou dos meus avós. Será muito importante, pois mais do que nunca eles precisam de muito amor e carinho, afinal não é qualquer um que chega aos 80 e poucos como eles chegaram.
No fim das contas, palavras nunca são suficientes para mostrar o verdadeiro valor das coisas, elas fazem com que apenas uma ideia represente tudo o que sentimos e pensamos. Mesmo assim, escrevo mais algumas linhas dizendo o quanto amo meus avós, o quanto são importantes para mim, o quanto me dói não tê-los sempre por perto, não tê-los eternamente.
Eu sei que uma hora ou outra tudo finda, é inevitável. Mas desejo do fundo do meu coração que no momento, ocorra tudo da forma mais doce e suave possível.
#Ao som de Mozart, Ravel, Tchaikovsky, Pachelbel, Schubert e Beethoven.